quarta-feira, 15 de abril de 2009

Le Goff e a antropologia histórica

O fascínio de Le Goff pela antropologia histórica implica a radicalização da proposta dos pais fundadores dos Annales: a longa duração, a supressão do acontecimento, a ênfase nas estruturas, o princípio da diferença, etc. O olhar etnológico detém-se nos ritos, rituais, gestos, festas, cortejos, os jogos, etc., buscando neles o homem cotidiano, dissolvido no dia-a-dia que raras vezes aparece na história. Por trás disso tudo, o que interessa a Jacques Le Goff é o domínio da cultura e os complexos processos que têm lugar aí. Apesar da recorrência do conceito de mentalidade, é outro o foco das suas análises. É preciso destacar uma característica legoffiana fundamental: a permanência aguerrida do conceito de luta de classes. Muitas vezes camuflado, sobre ele repousa as abordagens culturais do mestre francês. A sociedade de que ele nos fala é sempre lugar de conflito social, que se revela no campo da cultura: não é o mundo pasteurizado de Lucien Febvre, mas o jogo dinâmico de estruturas sociais e culturais. É na confluência perturbadora do material e do simbólico que as análises de Le Goff se desenvolvem: interessa-o sobretudo pensar como as realidades concretas são portadoras de imaginário, e como o imaginário influencia e modifica as realidades concretas. O mundo denso de imaginário, tal como visto por Le Goff, começa pelo prosaico cotidiano e pela cultura material. Adentrar nele é sempre um esforço hercúleo para se perscrutar a sociedade de uma época, as suas estruturas e o seu funcionamento. Será que estarei enganada ao afirmar que Le Goff levou a nova história cultural a um lugar inusitado e completamente original. Sem dúvida, um pós-marxista refinado, oriundo da mesma linhagem que E. P. Thompson...

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