terça-feira, 16 de junho de 2009

Pós-modernismo e História

O pressuposto pós-modernista central da análise histórica reside no relativismo levado ao limite: a ênfase na construção social e cultural da realidade conduz necessariamente ao desconstrucionismo da realidade, que já não é mais referente. Tudo não passa de um constructo histórico. Daí resulta a recusa de qualquer aspiração a verdades absolutas ou imutáveis. Segundo Ellen M. Wood, o problema do pós-modernismo na história diz respeito às suas implicações: sacrifica-se o geral e o coletivo (pensem nos ideiais de emancipação da humanidade), em nome do particular(identidades, culturas, etc.).
Bem, este problema não é novo. Ainda no século XVIII, a Filosofia das Luzes viu-se acuada pelo pós-modernista avant la lettre chamado Sade. Para além da variedade do mundo, os iluministas enxergaram na razão o baluarte capaz de levar a humanidade à felicidade. Havia uma aposta na razão, o que impedia o relativismo excessivo que nos domina hoje. Na verdade, o relativismo foi formulado com brilho pelos filósofos das Luzes, com a sua obsessão pelos países distantes, com costumes exóticos e insólitos. A convicção de que o mundo era vário e que o único princípio absoluto e válido residia na razão é uma conquista do Iluminismo.
Sade veio e chutou o pau da barraca: escarneceu da razão e brandiu a espada do relativismo, com a qual demoliu tudo à sua volta: moral, costumes, religião, etc. Sade ensinou-nos, com sangue e violência, que não há pedra sobre pedra. Que tudo é tão relativo, que a verdade é apenas uma falácia consoladora.
A crítica de Wood é tipicamente marxista e pró-iluminista. Aliás, mais do que nunca, Marx me parece aqui um legítimo herdeiro das Luzes. Salvar a razão iluminista é, para Wood, condição necessária para salvar os grandes sonhos do marxismo: a utopia de igualdade ou emancipação da humanidade fica ameaçada quando se destrói as categorias universalistas. Em seu lugar, nós, historiadores da cultura, perseguimos o local, o particular, o específico. Disso resulta uma história sem sonhos universais! Uma história sem verdades!
Olha, cara Ellen M. Wood, a última vez que vi alguém defender uma bandeira "absoluta" e "totalizante" foi quando George W. Bush invadiu o Iraque para levar até os "muçulmanos cegados pelo fanatismo religioso" os valores ocidentais - todos eles de base iluminista, como a democracia, a igualdade, etc. O que vi, em nome do legado iluminista, foi um banho de sangue. Nós, historiadores da cultura pós-modernistas, faríamos diferente: com a nossa compulsão pelo local, particular e minoritário, iríamos indagar àqueles bárbaros se queriam mesmo ser convertidos aos valores da NOSSA cultura. Sabe, pensando bem, nós deixamos sim de sonhar, mas ainda permitimos aos outros sonharem seus próprios sonhos - ou pesadelos.
Ironizando, tudo depende do nosso ponto de vista.

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