quinta-feira, 21 de maio de 2009

Algumas questões para Darnton.

Parece que entre os historiadores franceses há consenso de que os livros desempenharam papel fundamental na Revolução. Sem eles, a Revolução não teria existido. Penso que há dois aspectos a serem considerados: em primeiro lugar, coloca-se demasiada ênfase nos livros - e não no mundo da oralidade - para explicar o fato revolucionário. Talvez valesse a pena indagar se as pessoas não prescindiam de livros para empunhar armas contra autoridades e o próprio Estado. À imagem do revolucionário com um livro na mão, prefiro a do revolucionário com uma idéia na cabeça. Revoluções não necessitam, forçosamente, de livros, e homens rústicos e analfabetos têm, em todos os tempos, feito revoluções (não tão iluminadas quanto a Francesa) com grande sucesso. Mais decisiva que os livros é, na verdade, a cultura politica que está por trás da práxis revolucionária: cultura entendida como tradições, idéias, práticas, constituídas na experiência histórica dos homens. E esta cultura pode ser totalmente oral, partilhada por analfabetos, num mundo em que a oralidade é mais importante que a palavra escrita. O segundo ponto diz respeito à velha estória do ovo e da galinha: quem vem primeiro ? A literatura ou as idéias ? Será que a literatura, em vez de propagar e disseminar valores revolucionários, não ecoava idéias que já impregnavam o imaginário dos franceses, vindo portanto a reboque de um descontentamento generalizado ? Afinal, não me parece muito convincente a idéia de que o livro seja responsável pela criação de um mentalidade revolucionária. E análises centradas apenas na história da leitura e dos livros tendem a chegar a tal conclusão. Erro de perspectiva... Além disso, se as pessoas liam e se divertiam com as aventuras sexuais do rei é bem possível que o faziam porque o rei, para eles, já estava nu (desculpem-me o trocadilho).
Radicalizando ainda mais o meu argumento, creio ser possível até mostrar o processo inverso a que se refere Darnton: em vez da alta filosofia das Luzes chegar até o francês rústico da Provence (se é que o havia) através da baixa literatura, por que não cogitar que a alta filosofia tenha nascido em meio à plebe, num berço pobre e totalmente analfabeto, e que no espaço de algumas gerações tenha chegado aos grandes filósofos, amamentados no leite revolucionário da cultura política underground ?
E, por último, o fato de os franceses devorarem, ávidos, a pornô-literatura, não pode ser interpretado, apressadamente, como um ato de implicações políticas: talvez tal leitura fosse apenas divertida e picante.

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